Segunda, o dia mais penoso do mundo.
Com
um esforço sobrenatural levanto-me da cama e vou tomar o
pequeno-almoço. Na cozinha já lá está
minha mãe, um monte de suculentas panquecas e um copo de
leite.
-
Mmm que bom aspeto! Estou cheia de fome! - Disse enquanto devorava um
monte de panquecas.
- E
desde quando é que não estas com fome? - Perguntou
rindo-se.
Encolhi
os ombros e sorri. A fome humana nunca é tão intensa
como a Fome de lobo, por assim dizer. A Fome é dolorosa, nunca
mortal, mas enlouquecedora. Uma coisa que ninguém conseguiu
perceber é porque precisamos de comida humana e de comer algo
que bem, que esteja “vivo”. As melhores teorias dizem que, como
somos metade animais, temos o instinto de comer o que matamos ou
assim... Bem, apesar de todas estas suspeitas de uma coisa temos a
certeza: temos de saciar a Fome, porque se não a saciarmos
durante algum tempo, enlouquecemos e somos muito capazes de nos
transformar em público e comermos a primeira coisa viva que
nos aparecer. Mas, ao contrário do que as lendas dizem, não
somos afetados pela lua cheia, ou prata, caraças nem sequer
somos lobisomens, quer dizer transformamo-nos em lobos mas preferimos
o termo metamorfos.
Depois
do pequeno-almoço subi até ao meu quarto e vesti uma
sweatshirt preta, as primeiras calças de ganga que me
apareceram, as minhas all-star pretas e fiz o meu rabo-de-cavalo
habitual.
Como
ainda tinha tempo até serem horas de sair para ir para a
escola, aproveitei para ver um pouco de televisão, mesmo que
fossem só dez minutos. Os únicos programas que estavam
a dar eram uma seca, por isso, decidi sair mais cedo.
A
caminho da escola vi um alce escondido por entre a vegetação
que me deu água na boca. É estranho mas nesta cidade é
muito comum ver alces a vaguear pelas ruas. Para as pessoas normais
são uma praga horrível e perigosa, mas para a minha
família uma praga suculenta e deliciosa.
Aliás,
os meus pais decidiram mudar-se de uma vila do Alentejo, uma região
de Portugal, quando eu tinha mais ou menos seis anos, pois para
alimentar uma família como a nossa uma ou duas vacas não
davam e, se apanhássemos mais, os agricultores iam suspeitar.
Por isso andámos pela Europa até que o meu pai apanhou
o rasto de uns metamorfos amigos que estavam de férias na
Alemanha e nos sugeriram vir para cá.
Eles
também vivem aqui, na outra ponta da cidade, porem eles não
se transformam em lobo mas sim numa espécie de humano com
asas, dentes e ouvidos de morcego, que não se alimentam da
carne mas sim do sangue das presas.
Os
filhos dos amigos do meu pai, o Adrian e a Shioban, são os
meus melhores amigos e as únicas pessoas em que eu posso
confiar verdadeiramente.
Chego
e seguidamente e entro na enorme escola de South Anchorage High
School.
Não
tenho aqui praticamente amigos nenhuns, apenas uma rapariga simpática
que por vezes anda comigo, talvez por pena, a Sophie.
A
maioria dos humanos seguem o instinto de se afastarem de nós
por isso é difícil fazer amigos.
A
campainha toca e vou para a aula de Inglês do primeiro tempo.
Sento-me numa carteira sozinha e vou tentando prestar atenção
á aula. A aula estava a decorrer normalmente quando se ouve um
toque na porta.
-
Entre! - Gritou a professora.
-
Peço desculpa pelo atraso. - Um rapaz bonito de cabelo
castanho-escuro espetado, olhos incrivelmente verdes, t-shirt de
manga comprida preta, casaco de cabedal, botas de motoqueiro e um ar
de bad boy irresistível entrou. - Sou novo aqui.
Chamo-me Adam. Adam Hatten.
-
Não faz mal. - Suspirou a professora obviamente incomodada
pela interrupção. - Mmm... sente-se ali á beira
da mmm... Alexandra.
Bonito...
Não
me interpretem mal, o rapaz é muito giro mas, quanto mais
tempo estiver junto de mim, mais me achará esquisita e terá
medo de mim, tal como o resto da escola.
-
'lá! - Disse fazendo um sorriso encantador.
Fiquei
surpreendida. A maioria dos humanos seguia o instinto de se afastar
de mim, mas lá estava ele descontraído... só se
ele fosse um metamorfo.
Funguei
duas vezes e pelo cheiro, era um simples humano normal. Esquisito.
-
Olá. - Respondi finalmente.
***
-Então Alex, já
viste o novo rapaz? É tão podre de bom! - Disse a
Sophie alegremente sorrindo.
-
Sim, senta-se ao meu lado em inglês do primeiro tempo.
- Oh
meu deus! E então?
- Então o quê?
- Perguntei confusa.
- É tão
fixe como dizem por ai?
-
Sei lá. - Encolhi os ombros.
-
Meu deus, se fosse eu a estar ao pé dele... - Disse ela com um
olhar sonhador.
Revirei
os olhos. A Sophie apaixonava-se demasiado facilmente e depois
sofria, e bastante.
Fomos
até à cantina buscar a comida e sentámo-nos numa
mesa onde estavam umas amigas da Sophie. Sentei-me na cadeira mais
distante.
- Já
viste o novo rapaz Sophie? - Perguntou uma rapariga baixa, que se não
me engano, chama-se Anna.
-
Sim, é uma brasa. – Disse. - E sabes quem esta ao pé
dele... a Alex!
- A
Alex? - Olhou para mim com ar de “pobre coitado” mal disfarçado.
-
Sim! Não é maravilhoso?! Ela pode pedir-lhe o número
para nós! - Sorriu.
-
Seria tão fixe! - Disse outra rapariguinha cujo nome já
me esquecera.
Suspirei
e revirei os olhos. Ao mesmo tempo o Adam entrou na cantina e fez um
sorriso sedutor para umas raparigas que eram o total cliché
de meninas populares: loiras, com quilos de maquilhagem em cima,
decotes provocadores e shorts que mal tapam o rabo, que usavam mesmo
estando um frio de rachar.
Só
reparei que estava a olhar fixamente para ele quando a Stacia, uma
das raparigas a quem ele sorriu, fez-me um sorriso de desdém e
o seu clone mais burro, Avery ficou a olhar para mim como se fosse
contagiosa. Mas o que me surpreendeu foi o facto de o Adam me olhar,
bem, como se fosse normal, coisa que ninguém desta escola, sem
ser a Sophie, fazia.